Contribuintes excluídos do processo de negociação de dívidas do período da crise podem entrar na Justiça, diz jurista
Quem não fez a consolidação foi excluído do programa.
As pessoas físicas que tiverem sido excluídas do parcelamento especial de dívidas com a União, conhecido como Refis da Crise, por terem perdido o prazo para definir as condições de pagamento, podem recorrer à Justiça. Segundo especialistas, o direito é válido caso o contribuinte comprove não ter sido informado pelo governo sobre o calendário de renegociação.
De abril a agosto, os contribuintes que aderiram ao parcelamento em 2009 tiveram de se submeter à chamada de consolidação da dívida. Nessa etapa, os devedores indicaram os débitos a serem renegociados e o prazo de pagamento, o que permitia a definição do valor da parcela final. Até então, eles pagavam apenas a parcela mínima, de R$ 50 para pessoas físicas e de R$ 100 para pessoas jurídicas. Quem não fez a consolidação foi excluído do programa.
Segundo o cronograma estabelecido, as pessoas físicas, originalmente, teriam de fazer a consolidação em maio. No entanto, como o percentual de cumprimento foi baixo, a Receita Federal e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) reabriram o prazo de renegociação em agosto. Segundo os dois órgãos, desta vez, todas as pessoas físicas receberam a correspondência em casa e foram avisadas pelo Centro Virtual de Atendimento ao Contribuinte (e-CAC).
No entanto, há registro de casos de pessoas físicas que alegam não terem sido comunicadas. Para o jurista e advogado tributarista Ives Gandra Martins, quem estiver nessa situação pode pedir na Justiça a reintegração ao parcelamento. “Há uma série de sentenças do STJ [Superior Tribunal de Justiça] de que o contribuinte com endereço certo tem de ser intimado pessoalmente, não convocado por edital”, comenta.
Segundo Martins, a pessoa física terá de pedir à Receita ou à PGFN que prove o envio da notificação. Isso pode ser feito por meio de um levantamento do comprovante de recebimento, que é assinado por alguém da residência na entrega da intimação. “Se o comprovante tiver voltado sem assinatura, fica mostrado que a correspondência não chegou. Em tese, o contribuinte pode ser reintegrado ao parcelamento”, explica.
A coordenadora institucional da entidade de defesa do consumidor Proteste, Maria Inês Dolci, também defende o direito de o contribuinte recorrer à Justiça. “Mesmo que tenha perdido o prazo, o contribuinte demonstra interesse em chegar a um acordo e deve ir até as últimas consequências”, explica. Ela considera que a abertura dos prazos de consolidação foi pouco divulgada. “Um assunto dessa importância exige uma divulgação ampla. O cidadão precisa ter a oportunidade de acesso à informação.”
O Refis da Crise foi criado durante a crise econômica de 2009. Com o programa, o governo permitiu o parcelamento, em até 180 meses, de quase todas as dívidas com a Receita relativas a tributos atrasados e com a PGFN, dos débitos inscritos na dívida ativa da União, com desconto na multa e nos encargos.
As pessoas físicas excluídas do parcelamento podem ainda se basear no exemplo de empresas, caso tenham sido excluídas do programa de renegociação. Há pelo menos dois casos, no Espírito Santo e no interior de São Paulo, de pessoas jurídicas que conseguiram a reintegração ao programa depois de terem perdido o prazo para fazer a consolidação. Nos dois casos, a Justiça alegou que os contribuintes agiram de boa-fé nas etapas anteriores e que a reinclusão não traria custo aos cofres públicos.
Por meio da assessoria de imprensa, a Receita Federal informou que todas as pessoas físicas foram informadas no segundo prazo de renegociação, em agosto. A PGFN alegou ainda não ter sido oficialmente notificada das ordens de reinclusão de empresas no Refis da Crise, mas informou que pretende recorrer das sentenças.